Cortar glúten da dieta é controverso para quem não tem intolerância

Fonte: Equilíbrio e Saúde – Folha de São Paulo , por GABRIELA MALTA DE SÃO PAULO
06/10/2015

Se há alguns anos só não comia glúten quem não podia –os celíacos–, agora há quem corte a proteína em busca de uma alimentação mais saudável. Mas estudos e especialistas apontam que deixar de comê-la não tem efeitos sobre a saúde.

As atrizes Bruna Marquezine e Juliana Paes recorrem a uma dieta sem glúten para emagrecer. Até o atual melhor tenista do mundo, o sérvio Novak Djokovic, defende em seu recém-lançado livro “Sirva Para Vencer: A Dieta Sem Glúten Para a Excelência Física e Mental” (editora Évora) uma dieta livre da proteína.

O que ocorre é que o glúten está presente em derivados do trigo, do centeio, da cevada, do malte e da aveia. Ou seja, pão, macarrão, cerveja e vários alimentos industrializados como bolachas e torradas.

Quem deixa de comer esses alimentos, apontam os médicos, muitas vezes acaba perdendo peso –não por causa do glúten em si, mas porque pão, cerveja e bolacha não são exatamente as comidas mais saudáveis.
“Você acaba fazendo uma reeducação alimentar, porque presta mais atenção no que está comendo e corta muitos alimentos industrializados da dieta”, diz Jane Oba, médica gastroenterologista do Hospital Israelita Albert Einstein.

INTOLERÂNCIA

Os entusiastas antiglúten rebatem, porém, que não se trata apenas de peso.

Muita gente alega sentir algum tipo de desconforto após ingerir algum produto que leva glúten na fabricação: inchaço e desconforto abdominal, gases, estufamento.

O empresário Fernando Nakamura, 29, é uma dessas pessoas. Ele, que não é celíaco, sofreu com cólicas e gases desde criança. Decidiu então tentar uma dieta sem glúten e não tem mais os sintomas.

“O primeiro mês que fiquei sem o glúten já foi uma maravilha. Às vezes uma cervejinha ou outra escapa, mas tento seguir a dieta.”
A publicitária Bete Cidreira, 53, também diz que passou a sentir menos inchada e mais disposta quando cortou o glúten da alimentação.

Essas pessoas não são celíacas –uma doença autoimune desencadeada por um dos componentes do glúten que leva a um grave processo inflamatório–, mas podem ter algum tipo de intolerância.

O problema é que não se sabe exatamente como se daria tal intolerância no organismo.

Infográfico: Vida sem glúten

“Não há um consenso sobre o assunto. Mas onde há fumaça há fogo, e alguns pesquisadores estão tentando entender qual é a origem de tantos sintomas”, diz Fanny Dantas de Lima, médica alergista e imunologista clínica do Hospital Sírio-Libanês.

Pesquisas recentes apontam que talvez os responsáveis pelo desconforto sejam os “Fodmaps” –sigla em inglês para oligossacarídeos, dissacarídeos, monossacarídeos e poliois fermentáveis–, carboidratos que podem ser de difícil digestão para algumas pessoas.

“Esses nutrientes não são quebrados como deveriam durante a digestão, então são fermentados pelas bactérias intestinais, o que acaba resultando na sensação de estufamento, inchaço e gases”, afirma Jane.

Não há relação entre os “Fodmaps” e o glúten, mas eles estão presentes em alguns alimentos em comum.

Há “Fodmaps” em comidas sem glúten como a maçã e o abacate, mas também em pães, bolos, biscoitos ou cereais contendo trigo. Já banana, uva, tangerina, leite de soja e tapioca são exemplos de alimentos pobres em “Fodmaps” –mas, novamente, não há certeza entre os médicos sobre os impactos das substâncias no organismo.

Para Sophie Deram, nutricionista da USP, a recomendação mais geral que se pode fazer não é cortar produtos da dieta, mas sim apostar em uma alimentação mais variada. “Dietas restritivas demais são insustentáveis a longo prazo e aumentam a ansiedade”, afirma.

Até porque uma dieta completamente livre de glúten não é barata: um pacote de 90 gramas de bolachas sem a substância custa cerca de R$ 8, e uma garrafa de 600 ml de cerveja sem glúten custa, em média, R$ 18.