Impactos do Diabetes na Saúde Bucal: Prevenção e Cuidados

Impactos do Diabetes na Saúde Bucal: Prevenção e Cuidados

A saúde bucal está diretamente relacionada ao controle do diabetes, e entender essa conexão é fundamental para melhorar a qualidade de vida dos pacientes diabéticos

A diabetes apresenta diversas manifestações sistêmicas que podem afetar a saúde bucal dos pacientes

No dia 14 de novembro, é celebrado o Dia Mundial do Diabetes, uma data que visa aumentar a conscientização sobre a prevenção e o controle da doença, além de destacar a importância de um acompanhamento adequado para evitar complicações.

De acordo com o doutor em Endocrinologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), Prof. Dr. Fadlo Fraige Filho, que é presidente da ANAD (Associação Nacional de Atenção ao Diabetes) e da FENAD (Federação Nacional de Entidades e Associações de Diabetes), “uma das principais complicações do diabetes mellitus são as infecções que, através dos processos de ativação das citocinas inflamatórias, ativam os hormônios adrenais que vão aumentar a glicemia, descompensando de maneira mais ou menos intensa. Conforme a gravidade do processo inflamatório, as inflamações podem levar pacientes a descompensações enormes que necessitam internações hospitalares”.

Entre os vários aspectos da saúde que podem ser afetados pela diabetes, a saúde bucal é um dos mais importantes, devido à relação direta entre as condições bucais e o controle glicêmico dos pacientes. “A diabetes, um distúrbio caracterizado por alterações no metabolismo da insulina, apresenta diversas manifestações sistêmicas que podem afetar a saúde bucal dos pacientes. Pacientes com diabetes podem sofrer ao longo da vida de várias alterações de saúde relacionadas ao distúrbio no metabolismo da insulina”, explica o diretor do Departamento de Periodontia do Conselho Científico (COCI) da Associação Paulista de Cirurgiões-Dentistas (APCD) e professor da disciplina de Periodontia e Implantodontia da Universidade Santo Amaro, Dr. Ricardo Schmitutz Jahn. Ele destaca que, seja diabetes tipo 1, com déficit na produção de insulina, ou tipo 2, em que a ação do hormônio não é adequada, os pacientes estão sujeitos a complicações como dificuldades na reparação tecidual devido à alteração na produção de colágeno e em células inflamatórias.

Essas condições podem levar a ardência das mucosas bucais, xerostomia (redução do fluxo salivar), infecções oportunistas, como a candidíase, e doenças periodontais. “Da mesma forma, doenças inflamatórias da cavidade bucal também podem impactar na saúde geral do indivíduo que sofre de diabetes, uma vez que processos inflamatórios crônicos de baixa intensidade levam ao risco de aumento da resistência à insulina, característica dos pacientes tipo 2”, complementa o Dr. Jahn.

Para o professor de especialização em Periodontia da Faculdade de Odontologia da APCD (FAOA), Dr. Eduardo Saba-Chujfi, o conhecimento das manifestações sistêmicas e das reações celulares nos pacientes diabéticos é essencial para o entendimento da inter-relação entre diferentes especialidades médicas. “Fica cada vez mais claro que o diabetes agrava e modifica as doenças periodontais, assim como as doenças periodontais agravam e modificam as taxas glicêmicas”, afirma ele. O biofilme bacteriano presente nas doenças periodontais ataca os tecidos localmente com microrganismos, lipopolissacarídeos e outros produtos, desencadeando uma reação do organismo para conter a atividade lesiva, mediada por células como leucócitos e macrófagos.

Nessa resposta inflamatória, citocinas pró-inflamatórias como o TNF Alfa são liberadas, impactando não apenas os tecidos locais, mas também órgãos à distância. “O TNF Alfa é capaz de atacar as células Beta das Ilhotas de Langerhans do pâncreas, que são responsáveis pela produção de insulina. Com a lesão dessas células, a formação de insulina passa a ser pobre, gerando a chamada insulina resistente, incapaz de nivelar as taxas glicêmicas do nosso organismo”, explica o Dr. Saba.

Os sinais na saúde bucal que podem indicar um descontrole do diabetes incluem alterações no fluxo salivar e na mucosa da língua, mucosa jugal e gengivas. “Áreas operadas ou feridas podem ter reparação mais lenta, afinal, o metabolismo do colágeno pode estar alterado, e também podemos ter maior quantidade de biofilme dentário e, assim, maior risco de cárie e doenças periodontais”, destaca o Dr. Jahn. Entretanto, ele ressalta que tais situações também podem ocorrer em indivíduos não diabéticos, tornando o diagnóstico diferencial desafiador sem o suporte de exames laboratoriais e avaliação médica.

Cuidados Odontológicos Especiais para Pacientes Diabéticos

Para o tratamento odontológico de pacientes diabéticos, o Dr. Jahn recomenda sessões curtas, uso de anestésicos seguros, e informação e motivação para a higiene oral e atividades físicas. Ele também destaca a importância do tratamento periodontal no controle da glicemia: “Devido à grande quantidade de estudos que mostram melhor controle da glicemia em pacientes que receberam tratamento periodontal, um protocolo de tratamento que inclua raspagem e descontaminação radicular e o melhor controle de placa bacteriana para promoção de saúde são fundamentais”. O endocrinologista, Dr. Fadlo também sugere que “os Cirurgiões-Dentistas devem ter seus glicosímetros em seus consultórios para que façam um estadiamento da glicemia no momento antes da cirurgia, bem como medida de pressão arterial, pois cerca de 70% das pessoas com diabetes são hipertensas e o estresse cirúrgico odontológico pode elevar a pressão, aumentando o risco de ocorrer hemorragias”.

A inter-relação entre doenças bucais e diabetes está fortemente associada às doenças periodontais. “Ambas as doenças têm fatores etiológicos que se relacionam com hábitos, costumes e padrão de higiene dos pacientes. A diabetes leva a prejuízo em pacientes com doenças periodontais, assim como os pacientes periodontais precisam de atenção redobrada para melhorarem a condição do paciente diabético”, observa o Dr. Jahn. Os médicos clínicos e especialistas devem ser incentivados a encaminhar seus pacientes diabéticos para avaliações frequentes com cirurgiões-dentistas, evitando complicações que poderiam ser prevenidas com atitudes pouco invasivas.

“A abordagem multidisciplinar é fundamental no acompanhamento odontológico e nas intervenções também, visto que a falta da avaliação médica adequada e de uma alimentação adequada pode descompensar e até inviabilizar uma abordagem cirúrgica odontológica”, ressalta o Dr. Fadlo.

O Dr. Saba enfatiza que é imprescindível estimular estudos científicos conjuntos para motivar de forma consciente todas as áreas da saúde no tratamento de pacientes diabéticos, destacando a importância do exame de hemoglobina glicada para o controle da doença. “A manutenção das taxas glicêmicas por mais de três meses acaba formando os AGEs (produtos finais da glicolização não enzimática) e sua permanência gera os RAGEs (receptores dos AGEs). Nessa condição, órgãos são afetados de forma irreversível pelo efeito deletério da glicemia aumentada”, alerta ele.

É evidente que o diabetes e as doenças periodontais formam uma via de mão dupla, onde uma condição influencia a gravidade da outra. Portanto, o acompanhamento multidisciplinar e a conscientização dos pacientes são fundamentais para minimizar os impactos dessa inter-relação e melhorar a qualidade de vida dos pacientes diabéticos. Os profissionais de saúde, tanto médicos quanto Cirurgiões-Dentistas, precisam estar em sintonia para garantir que essas complicações possam ser evitadas ou minimizadas, promovendo assim um cuidado integral ao paciente.

Por Swellyn França